Nizan Guanaes, dono do maior grupo de publicidade brasileiro, afirma que os tempos são outros — e o marketing pessoal morreu
O empresário Nizan Guanaes, 54 anos, mudou de rumo várias vezes na
vida e na carreira. Veio da Bahia para São Paulo e conquistou o mercado
nacional como publicitário. Fez campanha política para o ex-presidente
Fernando Henrique, abandonou a publicidade e foi para a internet
comandar o portal iG. Então criou a agência África, embrião do ABC,
maior grupo publicitário brasileiro. Mudou também seus hábitos e sua
aparência. Já pesou 140 quilos e agora está em pouco mais de 90. Era um
notívago, viciado em trabalho, que estendia o expediente até alta
madrugada. Hoje acorda às seis da manhã para fazer uma hora e meia de
exercícios.
Nizan abandonou o cigarro e come salada, carnes brancas e arroz
integral. Casou, descasou, casou de novo. O que mais o empolga, além do
trabalho, é passar tempo com sua mulher, Donata Meirelles, e com os
filhos e enteados: Helena, Antônio e Zeca – prometeu, inclusive, levar
Zeca, corintiano roxo, à final do mundial, em Tóquio, se passasse de
ano.
Há algo de novo em Nizan. Sem perder de vista o objetivo principal de
levar o ABC à nona posição no ranking global da publicidade até 2015
(hoje, com receita anual de 1 bilhão de reais, é o 18º), ele parece mais
orientado ao desenvolvimento pessoal e aos pequenos prazeres da
existência. Há dois anos, faz terapia. “É um projeto para mudar de vida.
Não sou resolvido e tenho mais perguntas do que respostas”, justifica.
Em novembro, experimentou a meditação transcendental. Tenta esvaziar
sua mente, controlar o fluxo incessante de pensamento que o assola.
“Minha tradição é mudar”, afirma. “Não quero ser o perfeito, o cara
certinho, e tomo cuidado para não parecer o que não sou ou oferecer o
que não entrego.”
Nizan afirma que o marketing pessoal acabou. Para quem já disse que
marketing é tudo na vida, trata-se de uma mudança e tanto. “Acho um
negócio forçado. Parece um monte de passinhos que você precisa dar para
fazer sucesso e que não servem para nada.” Propõe que as pessoas sigam
sua natureza e façam aquilo que sabem. E dá algumas lições para se
vender bem nos novos tempos – mais relacionadas à transparência dos atos
e à evolução pessoal do que à simples promoção de si mesmo.
Erre rápido (e tome o caminho certo)
Se puder aprender com os erros dos outros, será melhor e mais barato. Se
for com os próprios, que seja rápido, para ter tempo de arrumar depois.
Cometer erros já não é considerado algo necessariamente negativo ou
vexaminoso. Pode ser efeito da ousadia. Teste, erre e refaça seu
caminho. “Com os erros não há compromisso”, diz Nizan.
O mundo hoje, segundo ele, é como um adolescente munido com um Google e
testando suas verdades. “É um adolescente te pentelhando, cobrando as
coisas que você diz, ali na hora”, explica. Então, tome cuidado. “Se
você se posicionar como infalível, o que é coisa de maluco, ou dizer
bobagens, vai ser cobrado no mesmo instante.”
As circunstâncias mudam, surgem novas descobertas, e situações
obscuras se esclarecem. Nizan afirma que mudar de opinião é algo normal,
e aqueles que entendem a transformação da realidade e reagem mais
rápido são os que sobreviverão. “É difícil pensar sempre do mesmo jeito.
Falei alguma coisa outro dia, mas mudei de ideia. E daí?”, pergunta.
Ele lembra que, ao longo da história, a discussão sobre uma maior
presença do Estado na economia foi cíclica e não se chegou a uma
conclusão sobre a questão. E sobre comer ovo de galinha? Nizan já ouviu
que é bom para a saúde e também que é ruim. Quanto à propaganda
(incluindo a de si mesmo), será sempre parcial e evidenciará o lado
positivo. “O que não pode ser é mentirosa. Se antes mentir era falta de
talento, agora é falta de juízo. Estamos em uma sociedade aberta”,
conclui.
Faça exercícios (e tenha mais resistência para o trabalho)
Em novembro, em uma reunião do Conselho de Conservação da América
Latina, da organização ambientalista The Nature Conservancy, da qual é
membro, em Foz do Iguaçu, Nizan reparou que boa parte dos empresários
mais poderosos das Américas, como o diretor da Inbev, Jorge Paulo
Lemann, ou o diretor executivo da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, fazem
exercícios com regularidade e estão determinados a se manter em forma.
Eles cuidam da alimentação, fazem meditação e evitam exagerar em
qualquer coisa. Cuidar da saúde é a tônica das conversas informais
nesses eventos que reúnem altos executivos.
“Ninguém entra hoje em uma maratona empresarial desgastante, com uma
carga muito grande de trabalho, sem estar preparado fisicamente”,
acredita. “O esporte vai cansar você na hora certa, à noite, mas ao
longo do dia dá mais disposição, tolerância e melhora sua capacidade de
resposta e o desempenho em tudo, em todas as dimensões, como
profissional, marido e pai.” Para quem chegou a perder 60 quilos, a
questão estética do sobrepeso é secundária, em relação às consequências
funcionais. “O problema é que você não consegue respirar direito com
barriga. E sem respirar a vida não é tão boa”, comenta. “O gordo tem
muitas limitações.” É claro que fazer exercícios e melhorar seu preparo
físico e sua aparência terá efeitos positivos sobre sua imagem, além de
beneficiar sua autoestima.
Desenvolva sua intuição (e veja o que os outros não veem)
Fórmulas existem para serem quebradas. Nizan montou uma nova agência,
chamada África Zero, em setembro, com esse objetivo: abandonar fórmulas e
recuperar uma velha maneira de fazer as coisas. É uma espécie de
butique de propaganda, que ele comanda pessoalmente, com uma proposta
irredutível. “Faço tudo o que o cliente pediu, só que do meu jeito”,
explica. “É uma agência intransigente em relação à possibilidade de
abrir mão da criação.” Os clientes estão contratando o discernimento e a
intuição de um publicitário com 30 anos de experiência.
“Ela tem esse nome porque é zero de burocracia e quase zero em
pesquisa”, diz. Na visão do publicitário, as agências trabalham
excessivamente orientadas por pesquisas. Na África Zero, Nizan pretende
ser o oposto daquele médico que lê exames e entrega uma receita pronta
para o paciente. “Existe uma coisa chamada intuição. É quando as pessoas
parecem falar uma coisa e você percebe que elas estão dizendo outra”,
afirma. “Se quiser fazer tudo de olhos abertos, seus olhos vão te
enganar. Sente, ouça, use os outros sentidos, seja Jedi.” Os primeiros
clientes da nova agência foram a Embraer e a fábrica de celulose
Eldorado.
Nizan está convencido de que há um lugar para a proposta da África
Zero, simplesmente porque não existem concorrentes com essa posição. “Me
sinto animado e tenho esse Viagra inside. Liderar é seguir os outros só
que um passo a frente”, define. “Quem tem intuição não precisa de
marketing pessoal.”
Encontre uma parceira ideal (e desfrute de um coaching permanente)
Ter a pessoa certa do seu lado pode ser uma vantagem competitiva. Ela
vai ajudar você a resolver problemas, a melhorar seu comportamento e,
consequentemente, a se vender. Se sua mulher for como Donata é para
Nizan, a parceria funcionará como uma espécie de coaching permanente,
contribuindo para seu aprimoramento pessoal. “Donata não fala tão bem
quanto eu, mas é melhor do que eu. É equilibrada, ponderada, resolvida e
delicada”, diz ele.
Nizan avalia que a parceria vem dando certo, com todos os desafios
que um casal pode ter, e isso é bom não só para seu desempenho
profissional, como para sua saúde mental. O empresário defende a tese de
que por trás de todo grande homem há uma mulher melhor ainda. “Donata
tem vida própria. Em muitas ocasiões, sou o marido da Donata e tenho
orgulho disso”, elogia. Segundo ele, encontrar uma parceira ideal é
difícil – raramente você consegue achar de primeira. “Foi um privilégio
encontrar alguém. Acho a ideia do casamento absurda, uma conta que não
fecha, mas muito pior do que casar é viver sozinho.”
Surfe a onda do Brasil (e consuma com responsabilidade)
Quando esteve em Foz do Iguaçu, na reunião dos ambientalistas, Nizan
teve um dia de folga e foi visitar as cataratas. Observou uma multidão
de turistas brasileiros se divertindo diante da paisagem alucinante com
suas novas câmeras fotográficas e smartphones. E se emocionou. “Vi o
povo brasileiro e suas conquistas, o que é um prazer. É o povo se
realizando. Antes, muita gente olhava aquela coisa cheia de riqueza, que
é o Brasil, e não usufruía de nada”, diz.
Hoje, não acreditar no Brasil é quase um defeito de caráter e queima
qualquer filme. Uma boa maneira de se vender é integrar-se ao processo
de desenvolvimento e surfar a onda do empreendedorismo nacional. Junto
com o enriquecimento, vem o aumento da capacidade de consumo. Nizan diz
que o brasileiro é um povo exuberante, que, por natureza, não é frugal e
gosta de muito. “Dona Maria quer beijar. As pessoas não querem só o
básico. O problema é você comprar o que não precisa. O consumo que
considero excessivo não é o variado, mas o desnecessário”, afirma.
Saiba escutar (e aproveite bem as ideias dos outros)
O irmão caçula de Nizan, o também publicitário Joca Guanaes, diretor da
DM9DDB, é uma das pessoas que mais o influenciam. Joca diz que o irmão
mais velho parece escutar pouco. “Ele é todo fofinho e interessado no
que os outros dizem, mas eu escuto muito mais do que ele”, garante
Nizan. “Quer um exemplo? Outro dia encontrei um conhecido e ele me disse
para assistir ao Super Bowl, nos Estados Unidos. A viagem está mar
cada.” Dia 6 de fevereiro, Nizan embarca para Nova Orleans, cidade-sede
da final do campeonato de futebol americano.
Ele aprendeu que vale a pena ouvir sugestões e que o retorno pode ser
uma experiência interessante. “Vivo muito das ideias dos outros.
Algumas das minhas melhores ideias, talvez a maioria, não eram minhas.
Foi o garçom que me disse, minha mãe, meu irmão. Ouço e faço”, conta.
Nizan sugere que se escute atentamente também os filhos e netos.
Ganhe força com as dificuldades da vida (e exiba sua garra)
Ser do povo pega bem. Nizan concluiu que o Brasil oferece hoje mais
oportunidades para o filho do cara que está ralando, que vem da classe
C, do que para o herdeiro do milionário acomodado, porque o principal
capital hoje é o intelectual e o de atitude. Vir de baixo,
evidentemente, não é um trunfo, por causa das restrições financeiras,
mas deixou de ser uma desvantagem insuperável. Com frequência,
adversidades se convertem em estímulos. E a vantagem inicial do rico
pode evaporar por falta de fibra. “É raro encontrar uma pessoa que teve
tudo e ainda demonstra fibra”, diz.
“Eu e Joca nascemos no Pelourinho e tivemos de chegar aqui andando.
Todo dia subia a ladeira do Carmo no caminho da escola e não tinha água
quente em casa”, lembra. Ele compara sua jornada com a dos quenianos que
ganham maratonas e diz que foi testado pela vida. Considera um mérito
ter se tornado um homem disciplinado. Garra e disciplina são atributos
que ajudam qualquer profissional a se vender e alavancam reputações.
“Não é da minha natureza, foi algo que busquei”, admite. Com 21 anos,
Nizan perdeu o pai, o médico Sócrates Guanaes. A mãe, a engenheira
Esmeralda Mansur, morreu este ano.
Seja fiel ao seu ofício (e encontre sua turma)
Você tem um talento, aprendeu um ofício, domina uma técnica. Se
desenvolveu alguma habilidade específica, saiba identificá-la e não a
abandone. Tenha clareza sobre aquilo que sabe fazer melhor. Nada como um
trabalho de qualidade para melhorar a imagem de um sujeito, afirma
Nizan. Identifique a função em que você pode entregar mais – lembre-se,
você é aquilo que entrega. Nizan tem absoluta clareza sobre suas
habilidades: cuidar do produto final do grupo ABC, de sua visão
estratégica e dos negócios. Só não deem para ele tarefas de
administração.
Essa é a parte que cabe ao seu braço direito, seu duplo, a quem ele
chama de irmão mais velho, Guga Valente, principal executivo do grupo.
Nizan o define como um homem calmo, ponderado e plenamente capaz de
cuidar da holding – de olhar para os custos e para as margens de lucro.
“Para resumir, diria que o Guga cuida do nosso negócio, e eu, dos
negócios dos outros. Sou o prestador de serviços. Isso está bem definido
para a gente, e vivo tranquilo porque tenho o Guga ao meu lado para me
dar limites.”
Nizan revela que sua analista costuma dizer que ele é empresário,
mas, antes disso, é artista. “Você não monta uma empresa do tamanho que a
gente está montando com um samba de uma nota só”, afirma. “Grandes
empresas são criadas com talentos complementares que conhecem muito
aquilo que fazem.”
Persiga o sonho (e veja o dinheiro como um meio)
Cada um tem de fazer o que gosta, o que combina com suas características
e lhe traz satisfação. Se quiser ser atleta, então leve vida de atleta e
alcance glórias esportivas. Se quiser ser músico, divirta-se e vá
trabalhar sábado e domingo. Nizan é contra essa coisa de dizer a um
filho que ele deve adotar uma ou outra profissão porque vai ganhar mais.
O importante é ser feliz com seu trabalho.
Quanto ao dinheiro – uma coisa ótima, admite –, trata-se de meio, não
fim. “Não teria a motivação que tenho se dinheiro fosse um fim, porque
já ganhei bastante. Seria mais fácil vender meu negócio e aproveitar a
riqueza”, afirma.
Para Nizan, transformar seus projetos em realidade é a melhor régua
do sucesso, pois é o que, de fato, faz a diferença para sua realização
pessoal. O sonho dele agora é comandar a expansão do grupo ABC e
transformá-lo em uma das maiores agências do mundo, com cultura e jeito
brasileiros de fazer negócios e publicidade. É um projeto do seu tamanho
e totalmente ao seu alcance. “Todo mundo respeita as pessoas que
perseguem seus sonhos. Conquistá-los é um excelente marketing pessoal e
provoca admiração.”
De ABC a XYZ – A saga de Nizan Guanaes para criar a maior empresa de propaganda da América Latina
No mesmo período em que as maiores agências do país foram
incorporadas por grupos estrangeiros, Nizan Guanaes criou um gigante da
propaganda nacional. Em dez anos, seu ABC, que reúne agências de
publicidade e empresas de branding e de conteúdo e eventos, tornou-se o
maior grupo brasileiro e latino-americano de serviços de marketing e
avança globalmente. Nos EUA, o ABC controla agências como Pereira &
O’Dell, Dojo e África NY. No Brasil, a XYZ Live faz eventos esportivos,
culturais e de moda, como o São Paulo Fashion Week e o Fashion Rio.
O perfil do grupo
Criação: Março de 2002
Sócios: Nizan Guanaes, João Augusto Valente, Sérgio Valente, Bazinho Ferraz, Grupo Icatu e Gávea Investimento
Onde atua: No Brasil, tem escritórios próprios em São Paulo, Rio de
Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador e Recife, e, nos Estados
Unidos, em São Francisco e Nova York
Pilares de atuação: Publicidade, branding, conteúdo e eventos
Agências e empresas: África, África Zero, Asia, b!ferraz, DM9DDB, Dojo,
Loducca, Morya, New Style, Pereira & O’Dell, Sunset, Agência Tudo e
XYZ Live
Funcionários: 2.200
Clientes: mais de 200
Faturamento estimado em 2012: 1 bilhão de reais
Matéria publicada na edição de ALFA de dezembro 2012